Saúde

Conheça as drogas usadas no golpe ‘boa noite, Cinderela’

Drogas usadas para aplicar golpe são potencializadas pelas bebidas alcoólicas
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A volta das festas em São Paulo fez crescer também o número de notificações de casos do golpe conhecido como “boa noite, Cinderela”. Criminosos usam uma ou mais drogas (legais e ilegais) para deixar a vítima inconsciente e assaltá-la ou até para cometer abuso sexual.

O grande perigo envolve a mistura dessas drogas, que costumam ser adicionadas à bebida alcoólica da pessoa.

No Ceatox (Centro de Assistência Toxicológica) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, as notificações mais frequentes envolvem o uso de medicamentos sedativos ou ansiolíticos.

Outras drogas ilegais podem representar um sério perigo à vida dos alvos dos criminosos. É o caso do GHB (ácido gama-hidroxibutirato).

Benzodiazepínicos

Os benzodiazepínicos são uma classe de medicamentos de tarja preta que têm como característica em comum diminuir a atividade do sistema nervoso central.

A assistente toxicológica e farmacêutica bioquímica do Ceatox Wellingta Crizostomo Gomes Correia explica que a droga mais frequente é o midazolam, um sedativo muito usado em exames de endoscopia ou como pré-anestésico. 

“Pelas características dele no organismo, quando associado principalmente com álcool [o midazolam] já causa esse efeito que a gente chama de dissociativo. A vítima tem um comprometimento de realidade, de memória… Ele é absorvido rapidamente e também é eliminado do corpo muito rápido, cerca de 15 horas depois. Muitas vezes você não vai ter a prova no organismo da pessoa caso tenha um exame toxicológico, por exemplo.”

Outros fatores que tornam os benzodiazepínicos mais usados pelos criminosos são o acesso eles e o preço desses produtos. Embora sejam medicações cuja aquisição requer receita, costumam ser obtidos com mais facilidade do que outras drogas.

Se a pessoa drogada com a combinação de álcool e benzodiazepínico fizer uso de algum medicamento, como antidepressivo, por exemplo, há o risco de o quadro se agravar, acrescenta Wellingta.

“Nesses casos, pode haver uma potencialização do efeito depressor. Ou, se o paciente é um idoso que já tem um comprometimento renal na metabolização e excreção da droga, o efeito pode ser mais grave, com evolução para um quadro de depressão respiratória e alteração cardiovascular mais importante.”

Os sintomas mais comuns dos benzodiazepínicos associados ao álcool são confusão mental, dificuldade de equilíbrio e para andar, fala arrastada, lapsos de memória e sonolência.

Zolpidem

Nos Estados Unidos, o zolpidem — um remédio para insônia — tem sido a droga preferida dos criminosos que praticam o boa noite, Cinderela. Trata-se de um medicamento amplamente comercializado no Brasil, apesar da necessidade de receita médica para adquiri-lo.

Segundo o American Addiction Centers, dos EUA, a associação de zolpidem com álcool pode causar tontura, sonolência, desorientação, confusão mental, alucinações, controle motor prejudicado, comportamento incomum, perda de memória e respiração lenta ou comprometida.

Assim como o midazolam, o zolpidem também é eliminado rapidamente — entre 14 e 17 horas para doses de 5 mg a 10 mg (meio e um comprimido, respectivamente).

GHB

Entre as drogas mais usadas no boa noite, Cinderela, o GHB (gama-hidroxibutirato) é uma das que mais oferecem risco à saúde. Trata-se de um líquido inodoro, levemente salgado e amargo proibido no Brasil. 

“Ele atravessa facilmente a barreira hematoencefálica, conduzindo a anestesia geral e depressão respiratória”, descreve o “Manual de Toxicologia Clínica: Orientações para assistência e vigilância das intoxicações agudas”, da Coordenaria de Vigilância em Saúde da Prefeitura de São Paulo.

Os sintomas começam entre 10 e 15 minutos após a ingestão da droga e são potencializados se o uso de álcool for concomitante.

Em baixas doses, o GHD causa relaxamento muscular, euforia e sonolência. Doses mais elevadas provocam perda da consciência, depressão respiratória, queda dos batimentos cardíacos, podendo levar ao coma e até à morte.

“No GHB, já vimos casos que culminaram realmente com sintomas graves e quadro de coma. Por ele já ser líquido, a gente entende que [isso] facilita um pouco para o criminoso colocar essa droga [na bebida]”, conta Wellingta.

Nos casos em que há queda da pressão arterial e dos batimentos cardíacos, o paciente deve ser levado à emergência de um hospital para receber tratamento de suporte, que pode incluir ventilação mecânica.

“Se [o GHD for] ingerido sozinho, a duração de coma é geralmente curta, com recuperação dentro de duas a quatro horas e a resolução completa dos sintomas dentro de oito horas”, descreve o manual.

Cetamina

A cetamina é um agente anestésico que tem versões para humanos e animais. A droga recreativa é uma versão em pó do líquido usado em animais.

Tem ação dissociativa, fazendo com que a pessoa perca a noção da realidade, e alucinógena. É uma droga menos utilizada no boa noite, Cinderela por ter uma absorção menor por via oral.

Doses elevadas podem causar distúrbios de fala e visuais, amnésia e vômitos. Em casos mais graves, há a possibilidade de depressão respiratória, apneia e convulsões.

Assim como ocorre com as demais drogas, o tratamento no caso de ingestão de cetamina é de suporte, acrescenta a assistente toxicológica do Ceatox.

“A gente tem antídotos para poucas substâncias, o tratamento é mesmo sintomático. Por exemplo, se o paciente está com queda da pressão arterial, você vai tratar a queda da pressão; se está com os batimentos cardíacos diminuídos, você vai tratar aquela bradicardia. Dificilmente você tem tempo para fazer procedimentos como lavagem gástrica ou carvão ativado. Normalmente, o cuidado é de suporte.”

Busca por auxílio

É importante a pessoa procurar atendimento médico e registrar boletim de ocorrência caso seja vítima de um crime desse tipo.

O hospital pode, se houver estrutura, realizar um exame de urina para saber qual droga estava presente no organismo.

O delegado de polícia também costuma solicitar o exame toxicológico no registro do boletim de ocorrência. Essa informação não interfere no tratamento, mas tende a ser útil na investigação. 

O Ceatox do Hospital das Clínicas oferece atendimento telefônico 24 horas à população e aos profissionais de saúde com orientações para esse tipo de caso. O telefone é o 0800-0148110.

Fonte: Saúde R7

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